terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Redução da Maioridade Penal

Estabelece o art. 228 da Constituição Federal que “são penalmente inimputáveis os menores de 18 anos, sujeitos às normas da legislação especial”. No mesmo sentido versa o art, 27 do Código Penal que traz a sua não aplicação àqueles, menores de 18 anos, que praticarem condutas tuteladas por este diploma legal.
A grande polêmica do tema não se dá com relação à questão de ser ou não reduzida a menoridade penal do art. 228 da CF, mas sim em tal regra ser ou não uma cláusula pétrea.
Estabelece o artigo 60, § 4° da CF limitações materiais aos objetos de emendas constitucionais. Ocorre que o art. 60, § 4° da CF não traz um rol exaustivo de limitações às emendas constitucionais, havendo também clausulas pétreas implícitas no bojo da Constituição Federal.
Neste aspecto, interessante trazer ao debate o entendimento de José Afonso da Silva sobre a existência de clausulas pétreas implícitas no bojo da Constituição Federal brasileira:
“(...) é claro que o texto não proíbe apenas emendas que expressamente declarem ‘fica abolida a federação ou a forma federativa de Estado’, ‘fica abolido o voto direito’ (...). A vedação atinge a pretensão de modificar qualquer elemento conceitual da Federação, ou de comunicação, ou outro direito e garantia individual (...)” [1].

Dentro de tal entendimento há duas posições acerca da admissibilidade do art. 228 da CF como sendo uma clausula pétrea implícita ou não.
Neste aspecto, corroboro com o entendimento trazido por Guilherme de Souza Nucci, negando o caráter de cláusula pétrea do art. 228 da CF.
           Ora, levando em consideração o ensinamento trazido por José Afonso da Silva, a modificação do art. 228 da CF não implica em violação indireta a nenhuma das clausulas pétreas apontadas pelo art. 60, § 4° da CF. Neste sentido, Nucci entende que
“(...) temos dois pontos a destacar. Em primeiro lugar não se encontra o dispositivo no Título II (Dos direitos e Garantias Fundamentais), Capítulo I (Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos) da Constituição Federal. Insere-se, como vontade do constituinte, no Título VIII (Da Ordem Social), Capítulo VII (Da Família, Da criança, Do Adolescente e do Idoso). Formalmente, pois, não é direito ou garantia fundamental. Em segundo lugar, poder-se-ia dizer que se trata de direito fundamental deslocado de seu contexto natural (art. 5° da CF). Para que isso fosse possível, segundo nos parece, deveria ser considerado um direito ou garantia humana fundamental de conteúdo material, vale dizer, universalmente aceito como tal. (...)” [2].

Ademais, pode-se notar que a idade de responsabilização penal varia de país para país, bem como estabelece o art. 1° da Convenção sobre os Direitos da Criança que “Para efeitos da presente Convenção considera-se como criança todo ser humano com menos de dezoito anos de idade, a não ser que, em conformidade com a lei aplicável à criança, a maioridade seja alcançada antes”.
No momento não se deve adentrar à discussão acerca da divisão feita pela legislação brasileira entre criança e adolescente, mas sim a questão de que a própria Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança menciona que a maioridade pode ser alcançada antes dos 18 anos de idade, caso o país queira.
É cabível mencionar que a Convenção em questão é um Tratado Internacional que versa sobre direitos humanos, e como ingressou no ordenamento jurídico anteriormente à Emenda Constitucional 45/05 possui caráter supra legal.
Neste sentido, embora não tenha o condão de alterar o art. 228 da CF, é possível interpretar que há norma de caráter supra legal no ordenamento jurídico brasileiro que estabelece a possibilidade de redução da maioridade prevista no art. 228 da CF, o que corrobora para o entendimento de que o presente artigo não se refere à uma clausula pétrea implícita.
Ora, se “a imputabilidade é a capacidade do ser humano de discernir entre o certo e o errado e, assim fazendo, optar, livremente, pelo caminho lícito ou do ilícito” [3], qual a diferença entre um adolescente que completará 18 anos no dia seguinte a prática de uma infração penal para um adulto que acabara de adquirir a maioridade?
Neste aspecto, inúmeras são as possibilidades de redução da maioridade penal. Não é possível que seja presumido o desenvolvimento mental incompleto de um ser humano diante da evolução das trocas de informações presentes em um mundo globalizado.
A legislação infraconstitucional adota, como regra, o critério biopsicológico para aferir a culpabilidade, ou seja, nas palavras Gustavo O. Diniz Junqueira
“para que haja inimputabilidade é preciso causa e conseqüência, ou seja, além de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado (causa), é preciso que o sujeito não tenha ao tempo da ação ou da omissão condições de compreender o caráter ilícito do que faz e portar-se de acordo com tal entendimento (conseqüência)” [4].

Neste sentido, é possível, inclusive, diminuir a maioridade penal, vinculando aos menores de 18 anos (imputáveis penalmente) a necessidade de um exame de maturidade, já que, há maiores de 18 anos imaturos e menores de 18 anos maduros o suficientes para ingressar em organizações criminosas.
Outro aspecto interessante se relaciona à política Criminal. Conforme dados consolidados do Departamento Penitenciário Nacional [5], em Dezembro de 2009 o país possuía 294.684 (duzentas e noventa e quatro mil seiscentos e oitenta e quatro) vagas no sistema penitenciário, sendo a população carcerária de 473.626 (quatrocentos e setenta e três mil seiscentos e vinte e seis) presos, ou seja, o sistema penitenciário comportava, em 2009, 60,72 % a mais de presos do que a quantidade de vagas.
            Sendo assim, como política criminal, tal redução da maioridade acabaria aumento ainda mais o índice de encarcerados no sistema prisional, o que não beneficiaria as estatísticas do Governo.


[1] SILVA. José Afonso da. Curso de Direito Constitucional. São Paulo. Ed. Malheiros. 2006. Pág. 67.
[2] NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais comentadas. São Paulo. Editora RT, 2009. Pág. 233/234.
[3] NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais comentadas. São Paulo. Editora RT, 2009. Pág. 234.
[4] JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz. Direito Penal. Coleção Elementos do Direito. 9° edição. RT. 2009. Pág. 99.